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Medalha Chico Mendes |

 
- 2 de agosto de 2013

Hélio Pellegrino

Quem foi Hélio Pellegrino? Poeta? Místico? Psicanalista sem cabrestos? O último dos utopistas? Cidadão radical? Humanista inveterado? Um desses raros mineiros que saem a subverter o sentido comum das coisas? Uma palavra ou um gesto basta para defini-lo? Uma saudade, ampla como um abraço, chega para delinear sua vida?

Tomar uma definição é desperceber as outras faces de Hélio: é ocultar seu lado noturno, permeável ao mistério dos seres, à fé num Deus vivo, ao pressentimento de vida eterna; ou só ver sua face solar – registrada no nome e na cara – , encontrada nas rodas de amigos, nas manifestações políticas, na criação do PT, na luta insone pelos direitos humanos.

Hélio quis chegar ao fundo das coisas e, para dar sentido à ira e à paixão que o lavravam, fez-se inteiramente cristão. Para ele, o céu começa aqui. O trabalho, a propriedade, as instituições, as relações que travamos são primícias do Reino de Deus. Por isso, devem humanizar-se para todos. Por isso, o capitalismo é detestável; e intoleráveis a mentira, a opressão e os privilégios. Por isso , também, afirmou que “nascemos para o encontro com o outro e não o seu domínio”.

Médico e psicanalista, demonstrava que os males que afligem os homens são causados por outros homens; religioso, fustigou nossa classe dominante pelo pecado de suas injustiças; político, empenhou-se num projeto ligado às lutas populares e ao advendo de um povo sem burgueses. Nunca lhe faltou esperança.

Em 1968, participou ativamente da passeata dos 100 mil e representou os intelectuais na comissão que discutiu com o General Costa e Silva a prisão dos estudantes e a situação nacional. Foi preso no ano seguinte; a Sociedade Psicanalítica do Rio de Janeiro – SPRJ, instituição à qual estava ligado, negou-se a escrever uma carta informando às autoridades sobre a ansiedade que sua prisão provocaria nos pacientes.

Essa mesma sociedade, já em 1969, abrigava como candidato à formação em psicanálise o medico Amílcar Lobo, homem de triste memória envolvido na tortura de prisioneiros políticos.

Ao longo dos anos 70, Hélio publicou textos na imprensa, nos quais denunciava casos de desrespeito humanos e tecia reflexões sobre a desventura humana nestas latitudes.

Em 1973, Helena Vianna denuncia ao exterior a participação de Lobo na pratica da tortura, motivo pelo qual foi muito perseguida pela Instituição. Em 1980, ao voltar à tona este caso, Hélio questiona a Sociedade e é expulso. Gera-se uma crise na SPRJ. A partir daí, a pratica da psicanálise no Brasil não foi mais a mesma. Psicanálise e política ficaram inequívoca e explicitamente ligadas; os analistas já não podem escapar à divisão entre progressistas e conservadores.

Em 1981, Hélio esteve em contato com ex-presos políticos para colher detalhes sobre a participação de Amílcar Lobo na tortura. Como a APRJ não tomasse providencias, denunciou essa conivência à Associação Psicanalítica Internacional, papado da psicanálise oficial, sediada em Londres. Até o fim de seus dias, Helio foi um acusador implacável desse episodio sinistro. Em 1986, levou oito ex-presos a uma assembléia na SPRJ para que informassem a mais de 300 analistas sobre o envolvimento do Lobo na tortura ocorrida nos quartéis na década anterior.

Hélio se associou, desde o inicio, ao Grupo Tortura Nunca Mais/RJ. Num texto famoso, explica como a tortura destrói a unidade do ser humano e procura – num inferno de sofrimentos – desconjuntar o individuo em duas partes antagônicas: seu corpo e sua mente. Reflexões desse tipo foram de grande valia para que muitos ex-presos pudessem compreender, com clareza, a lógica da engrenagem de tormentos e perversões que os atingiu.

Helio Pellegrino morreu em 1988 e vive em nossas almas. Com ele, “a vida se tornou inspirada e fecunda, mesmo na dor e no luto”.

Sim, amigo, havemos de amanhecer.

A tortura política

Hélio Pellegrino

A tortura política em nenhum caso é mero procedimento técnico, crispação de urgência numa corrida contra o tempo, destinada à coleta fulminante de informações. Expressão tenebrosa da patologi

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