LITERATURA

Caminhadas Vermelhas

Autor: Nelci Veiga Mello
Editora da FECILCAM
2010 – 340 páginas
R$ 40,00

Esta pesquisa delineia parte da história dos movimentos sociais de esquerda, primordialmente na região Centro-Oeste do Paraná, onde se localiza o município de Campo Mourão. Abarca o período de 1956 a 1974 aproximadamente. A composição baseou-se em depoimentos cotejados com documentos da Delegacia de Ordem Política e Social (DOPS), em posse do Arquivo Público do Estado do Paraná, jornais, documentos oficiais da Câmara Municipal de Campo Mourão e a história publicada dos anos de chumbo.

Através do fio narrativo de alguns agentes históricos, delinearam-se investidas do Partido Comunista Brasileiro, do PCdoB, da Ação Popular e uma das suas primeiras ações, entre outras. A militância de um “velho comunista”, Rui Ferreira, oferece as ações do PCB na primeira célula rural da região – São Benedito, sua derrocada e a tentativa urbana através da fundação do que seriam as “Ligas Camponesas Sulinas” – a União Geral dos Trabalhadores, em Campo Mourão e Campina da Lagoa. Posteriormente, a dissidência encabeçada por Marighela parece ter marcado o movimento em Nova Cantu, ação aberta apenas “aos iniciados”, “aos companheiros”, “lá onde o rio Cantu faz uma curva, uma ilha de noventa alqueires, ideal para acampar a turma” – a Curva da Judite. Esta base, com uma prática distanciada das dissidências ideológicas, serviu a interesses vários: dos partidos, de particulares disputando a posse da terra e dos pinheirais, de rota de fuga, o antigo BAU (Brasil, Argentina e Uruguai). Documentos do Exército, sob a guarda do Arquivo, ligam aqueles “que sempre estavam por lá”, isto é, na Curva da Judite e imediações, a outros com destaque na militância dos grandes centros brasileiros e suas respectivas atuações internacionais.

(...)
Este é um resgate de conflitos, sonhos e ilusões de uma comunidade inserida em ações com amplitude nacional e internacional e que, nas palavras de Tolstoi: “Todos aquellos actos que nos parecen voluntários no lo son en el sentido histórico. Están enlazados com la marcha total de la história y definidos para siempre”.

Texto da orelha de “Caminhadas Vermelhas”
Pedidos através do e-mail: nmtomadon@hotmail.com


 

Luta, Substantivo Feminino
Mulheres torturadas, desaparecidas e mortas na resistência à ditadura

Autora: Tatiana Merlino
Editora: Caros Amigos – São Paulo
2010 – 199 páginas
Distribuído pela Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República

Neste livro estão depoimentos pungentes de mulheres que continuam vivas e biografias das que morreram. Tristíssimos relatos da ditadura militar que nos fazem tremer até hoje face a tanta violência que aconteceu e acontece no mundo. Observando e analisando os torturadores, pensamos na frase de Primo Levi, judeu, químico italiano: “É isso um homem?” e que, como judeu, esteve no campo de concentração sofrendo toda sorte de tortura. Assim como Frei Tito, Primo Levi não conseguiu libertar-se dos seus sofrimentos e sua profunda depressão o levou ao suicídio.

Essas mulheres torturadas e mortas na resistência à ditadura têm direitos inalienáveis à memória e à verdade, sua luta não acaba com o seu desaparecimento nem com a sua morte. Sua luta continua, pois ainda estamos aqui. Essas mulheres foram vilipendiadas em seu corpo e sua vontade, transformadas em um monte de carne, ossos, dor e, sobretudo, medo.

É necessário ler o livro para compreender melhor o que houve no Brasil entre 64 e 85. Nesses relatos, nossos olhos se enchem de lágrimas e nosso coração de dor. Quantos pais perderam suas filhas “nessa luta justa contra um poder altamente discricionário e perverso”. É necessário abrir os arquivos – não cremos que foram queimados... – e publicar os nomes desses monstros torturadores.

A indignação e a revolta toma conta de nós, é necessário conhecer as verdades não oficiais para que isso não se repita jamais! Só assim podemos conhecer a nossa História. É um direito nosso.

 


 

Morrer para Viver
A luta de Tito de Alencar Lima contra a ditadura brasileira

Autor: Bem Strik
Editora: Brasilhoeve – Holanda
2009 – 717 páginas

Lendo o livro de Bem Strik deparei-me com a frase escrita na porta do inferno da “Divina Comédia” de Dante: “Deixai toda esperança ó vóis que entrais”. Nada mais eloquente para todos os locais de tortura e para aqueles que sofreram os piores sofrimentos, humilhações nos porões da ditadura militar no Brasil: nos Doi-Codis, Presídio Tiradentes... Por que não colocar também nos campos de extermínio de Hitler na 2ª guerra mundial? É uma frase triste mostrando o que nos esperava lá dentro: desesperança, dor, fome e morte.

Frei Tito, com todo sofrimento, não abriu a boca. Era um dominicano de 28 anos, cheio de idealismo e sonhos de um mundo melhor. Já expulso do Brasil e vivendo na França, no Convento de Sainte Marie de la Tourette, nada lhe trazia paz, seu atroz sofrimento com visões de seus algozes, achando que entrariam a qualquer momento para buscá-lo.

Segundo Frei Beto, o suicídio de Frei Tito foi um gesto de “protesto e reencontro do outro lado da vida”, pois ele jamais recuperou sua harmonia interior perdida. Era melhor morrer do que perder a vida. Sua vida sempre foi coerente e digna mesmo com as torturas e sofrimentos atrozes e sua perturbada mente.

Bem Strik é um sacerdote holandês que lutou contra os alemães e tem profunda empatia com Frei Tito, daí a necessidade de seu relato.

Ele combate, hoje, ardorosamente, o neoliberalismo e a concentração de tudo nas mãos dos Estados Unidos que controlam tudo na razão dos seus lucros e interesses imediatistas, que controla a indústria do consumo, que levam sozinho 35% dos recursos do nosso planeta, enquanto no 3º mundo, na África, por exemplo, morre-se de fome, de miséria degradante e de doenças. Todos nós pagamos juros exorbitantes e deveríamos lutar por tudo o que nos foi roubado, como nossas riquezas minerais. Se isso continuar, jamais haverá paz no mundo.

O livro de Bem Strik deve ser lido por todos aqueles que desejam saber e pesquisar sobre a História do Brasil, a vida de Frei Tito e a História da Alemanha na 2ª guerra mundial.

Em maio de 2010, a Assembleia Legislativa do Rio de Jneiro – ALERJ, através da Comissão de Direitos Humanos, homenageou Frei Tito com a Medalha Tiradentes post morten.


 

CINEMA

Cidadão Boilesen

Direção: Chaim Litewsky
Documentário, 2008

Boilesen foi um empresário poderoso, ligado à fina flor da sociedade paulista conservadora, conspiradora da queda de João Goulart, em 1964. Dirigente do complexo Ultragás/Ultralar, financiava os militares de extrema direita, como a Tradição Família e Propriedade – TFP, segmentos da Igreja Católica e empresários. Apoiava a permanência da ditadura militar e colaborava com o lado mais sinistro da repressão, com as torturas e assassinatos de líderes políticos de esquerda. Montou a OBAN (Operação Bandeirante) com equipamentos para torturar estudantes, operários e manifestantes políticos. Importou dos States uma máquina de provocar choques elétricos nos presos.

Foi justiçado por guerrilheiros urbanos em São Paulo. O filme insere muitas entrevistas com personagens de diversas tendências. Um dos melhores, senão o melhor, documentário de abordagem política, do cinema brasileiro.










Arquivos da Cidade

Roteiro e direção: Felipe Diniz e Luciana Knijnik
Realização: Modus Produtora de Imagens
Documentário, 2009

Este filme, gravado no Teatro de Arena, em Porto Alegre, em maio de 2009, traz 29 minutos de depoimentos pungentes de seis brasileiros que são uma amostra dos milhares que sofreram nas garras desumanas do poder ditatorial que se instalou em nosso país de 1964 a 1983. Numa sequência de emoções, e não de cronologia ou de qualquer outra ordem, escutamos sem querer parar de ouvir: Antonio Cunha Lousada, Carlos Alberto Tejera De Ré, Gregório Mendonça, Ignez Maria Serpa Ramminger, João Carlos Bona Garcia e Lino Bruno Filho.

Eles são personagens que compõem a história do Brasil. Vivendo no sul do país em um dos períodos mais violentos da ditadura civil-militar, resistiram ao terror imposto pelo Estado e sofreram na pele a prisão, a tortura e o desaparecimento de familiares e amigos. A ousadia de lutar por seus ideais colocou esses personagens à mercê da brutalidade da repressão. O filme Arquivos da Cidade mostra que esta história está ainda viva em todos nós.

 


 

POESIA

Após um amigo, evangélico, se declarar a favor da pena de morte;
procurando entender como ele deve se justificar.

Espera cristã

Rafael Maul

Cristãos perdem a pena
pedem a pena
de morte
Se o salvador voltará
deve-se identificar
com sorte
deve-se identificar
com morte
entre tantos ladrões
qual deles ressuscitará

De três em três
ou de trens em trens
a exemplo do norte
matemos todos
com cruz, cadeira ou veneno
todos torturemos
nenhum salvemos
Pelo rei dos desviados esperamos
Não se pode dizer que não tentamos
Experiência temos:
inquisição, imposição e escravidão por anos
a fio
no fio
de lâminas e chicotes
no frio afogamento
no fogo e nos choques
sem dar ouvido a lamento
algum
pois o fim é juízo
afinal

Esperamos por ele enquanto
nossos condenados condenamos
Enquanto pés no chão cortamos
pregamos a adoração da cruz
e não a revolta dos que nela foram pregados
por recusarem a curvar e esperar
Ainda assim esperamos e curvamos
para sermos salvos
de nós mesmos
de nossas penas
e de nossa falta de pena




 

Um grito que não cala

Rosivaldo Alves Pereira


Até as paredes ouviram os gritos e sussuros,
viram a omissão participativa, dos que estavam lá
e todos sabiam, porém compartilhar o medo ou a concordância
muda que não deixa falar.

As paredes viram e ouviram caladas consentiram atos
de covardia na calada da noite, quando bestas-feras
locupletavam-se com instintos selvagens, imcompatíveis
com seres humanos que num orgasmo torturavam.

Até a curupira viu e ouviu tiros nas florestas e não
era caça de sobrevivência, era caçada humana com
requintes de crueldade, não eram onças ou leopardos,
eram hienas no exercício sádico da caça indefesa.

Mesmo lavando com creolina e cloro os gritos gravados nas
paredes não calam, mesmo que as tintas nas folhas de jornais
contem meias verdades, os gritos não calam, estão incessantes
e inquietos nas mentes que buscam justiça, estarão cobrando
justiças ocultas dos torturadores.

 

Anônimos

Rosivaldo Alves Pereira

 

Na penumbra os nomes deles são falsos,
só o meu é verdadeiro e o pau-de-arara
não transporta ninguém para lugar nehum,
a não ser a eles para o orgasmo das sevícias,
talvez seus únicos prazeres.

Na penumbra eu tenho nome, sobrenome e na luz do
dia também, nas ruas também sem nome eles continuam
na penumbra, mesmo na luz do dia.

Na penumbra covardes se agigantam, no dia rastejam
como vermes esquivam-se da identificação, nós somos
Santo Dias, Fiel Filho, Herzog ou Lamarca, clamando
por suas identidades e por nossa justiça.

A nós na penumbra está destinado o prazer
de deslizar as mãos nos corpos desejados e
desfrutarmos os beijos de amor, a eles
na penumbra a masturbação das vanglorias
das sevícias nas tocas de suas casernas.



Trágico momento

Jane Quintanilha Nobre de Mello

Insuportável limite
Imposto
Posto no rosto
que se transfigura
Rastros apagados pela
chuva fina.
Vontade de recomeçar
o intangível.
Intransponível regresso
jamais imaginado.
Valores morais transgredidos,
linguagens truncadas.
Tudo pelo avesso.
Ameaçadoramente catastrófico.
O mundo, o ser se vê diante do intolerável.