CARTAS

Violência em 1964

Ultimamente tenho ouvido muito sobre as pessoas que sofreram abusos físicos na época da ditadura. Eu fui torturada mentalmente e guardo até hoje o fato com pânico. Em 1964 eu estava com 17 anos de idade e trabalhava nas Indústrias Borton e Lemmeterz na Via Dutra em Guarulhos/SP. Apesar da minha pouca idade eu precisava trabalhar para ajudar meus pais em casa e arrumei este emprego perto de onde eu morava.

Numa manhã como todas as outras, saí de casa e me encaminhei até a empresa onde trabalhava. Chegando na entrada havia pelo menos uns cinco carros do Exército e os soldados, que estavam fora deles, eram muitos!!!

Cheguei e tentei entrar, sem saber o que estava havendo, quando alguns deles vieram pra cima de mim com uma baioneta (hoje sei que se chama isto) e começaram a gritar alto, dizendo que se eu não sabia que não era para entrar e trabalhar. Eu disse que não sabia, e eles disseram: “então vamos ensinar a ela”. Eu só dizia que precisava trabalhar senão iam descontar no meu salário, e que eu não podia ganhar menos pois tinha que ajudar a família. Eu insistia até que um deles colocou aquela faquinha da ponta da baioneta em minha testa dizendo que ia me cortar...

Comecei a chorar e pedi para me deixarem ir embora, eles perguntaram minha idade e onde eu morava, eu falei, e aí me dispensaram. Saí de lá correndo até minha casa, mas antes de chegar, vi um dos caminhões indo praticamente junto comigo até minha casa. Chegando lá, chamaram meus pais e disseram para eles me segurarem em casa e que meus pais também não deveriam sair que eles estariam nos observando. Foi um horror porque nós não sabíamos o que estava ocorrendo.

Começamos a perguntar o que estava havendo para algumas pessoas e só assim fiquei sabendo que os militares estavam no controle do país e de nossas vidas. Tolinha, eu não tinha noção dos perigos, mas enfim estou aqui aos meus 62 anos, viva, mas com esta triste recordação, que sempre pensei em contar e que só agora me detive aos detalhes.

Vera l. M. Perpetuo
(Via e-mail)


Violência na Baixada Santista

Aos Amigos e companheiros

Nós, Mães e Familiares de Vítimas do Estado Genocida, vimos através desta, agradecer a todos e a todas pelo belíssimo trabalho em apoio a essa grande causa, que não é só das mães e familiares, mas sim de todo povo brasileiro.

Sem o apoio de todos, não conseguiríamos atingir o objetivo de nossa causa, e continuaremos a denunciar os crimes de maio, incansavelmente. Pedimos a todos que continuem nos apoiando, para que esses casos sejam desarquivados e federalizados e que o Estado seja punido exemplarmente.

Lutaremos contra uma mídia desumana, que jamais mostrou a verdade, mas todos os movimentos sociais gritam em um só coro: “Salve a verdade! Contra o Estado genocida!”

Um forte abraço!


Associação Amparo de Mães e Vítimas de Violência da Baixada Santista
(Via e-mail)


Abertura dos arquivos

Entrei para o GTNM/RJ em 1985, após o suicídio do companheiro Gustavo Schiller, que pulou da janela de meu apartamento em Copacabana. Um mês depois, sofri uma intervenção cirúrgica no rim direito, que havia sido deslocado durante tortura no DOI-CODI da Barão de Mesquita, em abril de 1972.

Portanto, não sou “um estranho no ninho”, tenho todos os motivos da vida para exigir Direito e Justiça. Por isso eu penso que é necessário e importante a abertura pública dos documentos e arquivos dos Órgãos de Repressão!

É imperioso e urgentíssimo o acesso – de todo o povo brasileiro – a estes documentos, sob pena de a História dos brasileiros, que enfrentaram a ditadura e seus algozes, ficar para sempre obscura. Somente a abertura desses arquivos, poderá expor os responsáveis pelas atrocidades cometidas em nome do Estado Brasileiro.

A História não tem anistia! O conhecimento dela é um direito do cidadão.

Obrigada,

Regina Helena Marieuse Xexeó
(Via carta)


Falta de memória

Prezados:

Primeiramente, gostaria de parabenizar o trabalho desenvolvido pelo GTNM/RJ. O nosso país nos aterroriza e amedronta pela falta de memória e pela impunidade cotidiana dos mais diversos torturadores.

Somos uma geração castrada pela ditadura militar. A minha geração é totalmente alienada e apolítica, ninguém dá valor a nada de importante. Imagino como é triste para os sobreviventes de uma época de lutas trágicas, bárbaras e covardes, como a geração sobrevivente do golpe militar dos anos 60, assistir a um país sem propósito, sem memória, sem verdadeiros heróis.

Estive em Buenos Aires esse ano e me emocionei com as mães da Plaza de Mayo. Há mais de trinta anos, TODAS as quintas-feiras um grupo de mulheres se reúne para pedir explicações pelos parentes mortos pela ditadura militar na Argentina. Algumas vezes elas são recebidas pela Casa Rosada, porém, na maioria das vezes são "ignoradas" pelas autoridades. E, o mais impressionante é justamente a perseverança de se manifestarem em prol do não-esquecimento.

Diante da nossa lamentável realidade só podemos dizer como é triste o nosso amado Brasil!

Gostaria de poder ajudar mais o GTNM/RJ, porém, não disponho de recursos financeiros. Sou advogada recém-formada e, se possível, gostaria de contribuir com vocês realizando algum trabalho ou atividade.

Aguardo contato,

Livia Paschoal
(Via e-mail)