BIOGRAFIAS

21ª Medalha Chico Mendes de Resistência

Em 31 de março de 1989, alguns oficiais do Exército homenagearam com a mais alta comenda desta arma, a Medalha do Pacificador, vários militares e civis que participaram ativamente dos órgãos de repressão durante o período ditatorial (1964-1985).
Naquele dia, o Grupo Tortura Nunca Mais/RJ – que se organizara desde abril de 1985 – fez um pequeno ato diante do local das homenagens: o quartel da Polícia do Exército, na Tijuca, subúrbio do Rio de Janeiro, onde havia funcionado o famigerado centro de torturas, o DOI-CODI.
Foi uma pequena manifestação onde alguns familiares e militantes do GTNM/RJ, vestidos de negro e em silêncio, mostravam aos carros oficiais que chegavam para a solenidade cartazes com fotografias de alguns opositores mortos e desaparecidos pelo terrorismo de Estado que se implantou em nosso país. Foi durante esta manifestação que se pensou em uma Medalha para os resistentes e insurgentes, no sentido de afirmar outros embates, outros personagens, outras memórias.
Até os dias de hoje realizamos anualmente o evento a cada 01 de abril, como forma de lembrar os maléficos efeitos trazidos pelo golpe civil-militar de 1964 para toda a sociedade brasileira e afirmar a dignidade e a memória daqueles que deram suas vidas por uma sociedade mais justa e fraterna.
Nesta 21ª Medalha Chico Mendes de Resistência, temos como entidades parceiras a Associação Nossa América; Centro pela Justiça e pelo Direito Internacional – CEJIL/Brasil; Comissão de Direitos Humanos da OAB/RJ; Comitê Chico Mendes; Instituto de Defensores de Direitos Humanos – IDDH; Justiça Global; Partido Comunista Brasileiro – PCB; Rede de Movimentos e Comunidades Contra a Violência.

Homenageados 2009:

Abdias do Nascimento
Abdias do Nascimento é Professor Emérito da Universidade do Estado de Nova Iorque e Doutor Honoris Causa pela Universidade de Brasília, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Universidade Federal da Bahia, Universidade do Estado da Bahia e Universidade Obafemi Awolowo, em Ilé Ifé, Nigéria.

Nascido em Franca, SP, em 1914, atua no movimento social afro-brasileiro desde a década de 1920, quando protestou contra a exclusão de negros da Guarda Municipal de São Paulo. Participou da Frente Negra Brasileira nos anos 1930, e ajudou a organizar o Congresso Afro-Campineiro em 1938.

Preso à revelia por resistir a agressões racistas, criou na Penitenciária de Carandiru, São Paulo, em 1941, o Teatro do Sentenciado. Fundou o Teatro Experimental do Negro – TEM, no Rio de Janeiro, em 1944.

Organizou a Convenção Nacional do Negro que propôs à Assembléia Nacional Constituinte de 1945 políticas afirmativas e a definição da discriminação racial como crime de lesa-pátria. Promoveu o 1o Congresso do Negro Brasileiro e realizou o Concurso de Artes Plásticas sobre o tema do Cristo Negro.

Abdias Nascimento foi curador do Museu de Arte Negra, projeto do TEM. Nos Estados Unidos, foi impedido de voltar ao Brasil em razão do Ato Institucional nº 5. Desenvolveu no exterior sua atuação como artista plástico, pintando telas que transmitem os valores da civilização africana e da cultura religiosa afro-brasileira. Expôs essa obra em numerosos museus e centros culturais em diferentes regiões dos Estados Unidos. De volta ao Brasil, fundou o Ipeafro, Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros.

Como deputado federal apresentou o primeiro projeto de políticas públicas de ação afirmativa para a população afro-brasileira. Ajudou a criar a Fundação Cultural Palmares. Foi titular fundador da Seafro, Secretaria de Defesa e Promoção da População Afro-Brasileira, e da Secretaria de Estado de Direitos Humanos e Cidadania, ambas do Governo do Estado do Rio de Janeiro. Recebeu muitas homenagens no Brasil e no exterior.

Aurora Maria Nascimento Furtado
Aurora Maria Nascimento Furtado nasceu em São Paulo em 1946. Era bancária, estudante de Psicologia na Universidade de São Paulo e responsável pela imprensa da União Estadual dos Estudantes de São Paulo.
Militante da Ação Libertadora Nacional – ALN, foi responsável pela publicação do jornal Ação e, após o AI-5, passou à clandestinidade.

Foi presa em 1972 em Parada de Lucas no Rio de Janeiro. Conduzida à Invernada de Olaria, foi submetida às mais cruéis torturas tais como a “coroa de cristo”, que consiste em uma fita de aço que vai gradativamente sendo apertada e esmagando paulatinamente o crânio do prisioneiro. Aurora morreu no dia seguinte à sua prisão.

No entanto, seu corpo foi crivado de balas e jogado na esquina das ruas Adriano com Magalhães Couto no bairro do Méier. A versão oficial sobre a sua morte foi a mesma tantas vezes utilizada pelos órgãos de repressão naquele período, isto é, que ela havia sido morta a tiros durante uma tentativa de fuga.

Seu corpo foi identificado por sua irmã, que constatou o grau de violência ao qual ela havia sido submetida. A morte de Aurora sob tortura foi confirmada pelo general de brigada Adir Fiúza de Castro no depoimento prestado por ele a pesquisadores do CPDOC da FGV e publicado no livro “Os anos de chumbo: a memória sobre a repressão”.

No dia onze de novembro de 1972, seu corpo foi trasladado para São Paulo e entregue à família em caixão lacrado com ordens expressas para que não fosse aberto. A história de sua militância e de seu suplício foi imortalizada por Renato Tapajós em seu livro “Em câmara lenta”.

Carlos Henrique Latuff de Souza
Carlos Henrique Latuff de Souza nasceu em 1968, na cidade do Rio de Janeiro. Gostava de desenhar desde criança e começou a trabalhar profissionalmente como ilustrador em 1989, para uma pequena agência de propaganda. Em 1990, encontrou outra maneira de viver da arte que produzia: fixou-se na imprensa sindical com as suas charges contundentes.

Mas a militância do cartunista, hoje tão conhecida e reconhecida mundo afora, traz como marco um documentário sobre o movimento zapatista que Latuff assistiu na televisão, em 1996. A partir de então, achou que poderia produzir imagens em apoio àquela e a outras causas. Latuff não fica só ao lado dos zapatistas, mas também dos sem-terra, dos sem-teto, dos moradores de favelas, dos estudantes, dos iraquianos, dos palestinos... Posiciona-se claramente contra qualquer forma de violação aos direitos humanos,
Latuff mora no Rio, mas parece viver em muitos lugares ao mesmo tempo: Chiapas, Oaxaca, Iraque, Bolívia, Haiti, Cuba e Palestina. Seus traços ilustram jornais, revistas e exposições em Gaza, no Egito, na Grécia, na Turquia, no Iraque, na Bélgica, na Arábia Saudita, no Líbano e na Suíça, por exemplo.

Mas sua atuação não se resume a simplesmente presentear com seus desenhos as bandeiras nas quais acredita. Latuff não se esconde atrás da arte que produz e luta por aquilo que considera politicamente relevante. Produz e divulga vídeos na internet, como o que dedicou à memória do líder comunista Gregório Bezerra e os vídeos denunciando a repressão ao movimento estudantil no Rio de Janeiro. O cartunista tem enfrentado ameaças e intimidações daqueles que se sentem incomodados com o alcance da sua arte.

Latuff usa e incentiva o uso de táticas de ativismo político à distância, alimenta e se sente alimentado pelos movimentos que apóia. Enfim, não se trata somente de um chargista engajado, mas de um ativista político – no melhor sentido do termo.

Inah Meirelles de Souza
Inah Meirelles de Souza nasceu na cidade de Conquista, no triângulo mineiro, em dezembro de 1923. Na adolescência, veio com sua família para Marechal Hermes, subúrbio do Rio, onde ficou até se casar, em 1945, com um jovem aviador com quem teve dois filhos (Iná e Colombo).

Em 1955, um trágico acidente interrompeu a felicidade do casal e Inah ficou viúva. Em 1969, soube que sua filha, Iná Meireles de Souza, e seu então genro, Marco Antonio Medeiros, haviam sido presos no Paraná e que se encontravam sendo torturados na Ilha das Flores, à época base de um centro de torturas da Marinha. Esta noticia transformou sua vida que a partir daquele momento passou a girar em torno das prisões.

Em 1970, seu filho Colombo e sua companheira Jessie Jane foram presos juntamente com dois outros jovens, Fernando Palha Freire e Eiraldo Palha Freire. Na manhã seguinte, sua casa foi invadida por agentes da repressão que a levaram presa para o DOI-CODI e, posteriormente, para o CISA. Foram trinta dias de terror. Ali Inah assistiu seu filho ser torturado e conviveu com dezenas de mulheres que também estavam sendo interrogadas e torturadas.

Nas visitas feitas ao seu filho, Inah conheceu e se apaixonou pelo preso político Odria Duqueiro Olaya e com ele conviveu até 2001 quando, mais uma vez, perdeu seu companheiro. Hoje, aos 85 anos de idade, goza o prazer do convívio com seus filhos e nora: Iná, Colombo e Jessie Jane; seus netos: Ivan, Nina e Leta; e a bisneta, Raquel.

Permanece indignada com tantas injustiças, lê quase tudo que se escreve sobre aquela época e lembra com bom humor os momentos e as histórias vividas ao longo das milhares de viagens à Ilha Grande, Ilha das Cobras e ao Presídio Talavera Bruce. Emociona-se, sobretudo, ao ter notícias daquelas mulheres, suas companheiras de viagens e lutas e daqueles “meninos” aos quais protegeu. Por fim, podemos afirmar que através dessa homenagem estamos prestando tributo a todas as mães que ainda hoje, Brasil afora, buscam os corpos de seus filhos ou os acalenta nas celas das delegacias ou nos depósitos de presos que o poder teima em chamar de presídios.

Italo Conrado Monteiro Nogueira
Italo Conrado Monteiro Nogueira, 24 anos, formou-se em Jornalismo em 2007 na UFRJ. Ainda quando estudava, estagiou na Revista Eletrônica do Terceiro Setor, da Rits (Rede de Informações para o Terceiro Setor), onde teve pela primeira vez contato com temas relacionados aos direitos humanos. Em 2005, passou a estagiar no jornal "O Dia". Em 2006, saiu do jornal para tentar uma vaga na Folha de S. Paulo, onde trabalhou como freelancer por pouco mais de um ano. Em 2007, foi contratado pela sucursal do Rio. Este foi um ano em que a polícia do Rio bateu recorde de mortes em supostos confrontos, o que tornou o assunto um dos focos do seu trabalho no jornal: avaliação das políticas públicas de segurança e do abuso policial; acompanhamento dos dados de criminalidade, buscando casos que possam trazer uma "cor real" ao cenário (geralmente não muito bom) que os números trazem.

Jornalistas sempre são convocados, por movimentos sociais e organizações de defesa dos direitos humanos, para cobrirem casos de violações, depoimentos em comunidades pobres, e julgamentos de agentes do Estado envolvidos em abusos contra os cidadãos. Italo é um dos poucos que sempre comparece, atento ao que dizem os militantes de direitos humanos atingidos pelas diversas formas de violência estatal que sofre a população pobre.

Além do próprio preconceito enraizado na sociedade, e das possíveis ameaças dos próprios violadores, um jornalista comprometido com os direitos humanos tem que lutar contra a linha editorial da grande imprensa, que volta e meia se revela em posicionamentos vergonhosos diante da tortura e da execução sumária.

Italo já obteve reconhecimento por seu compromisso na luta contra a opressão. Foi vencedor do 1º Concurso Fórum de Reportagem, promovido pela "Revista Fórum" em 2005, com a reportagem "A música como forma de resistência". Em 2008, recebeu menção honrosa no XXV Prêmio de Direitos Humanos da OAB-RS, pela reportagem "Mãe investiga morte do filho e 'condena' PMs", em que relatou o esforço feito por Marcia Jacintho para esclarecer o assassinato de seu filho, cometido por policiais militares em 2002, na favela do Gambá, Zona Norte do Rio.

José Batista Gonçalves Afonso
José Batista Gonçalves Afonso nasceu em 1964, em Turmalina, Minas Gerais, filho dos camponeses Abel Afonso de Macedo e Cândida Gonçalves de Freitas. Em 1973, a família migrou para Paraíso do Norte, no norte de Goiás (hoje estado do Tocantins) e, em 1977, chegaram em Conceição do Araguaia, no sul do estado do Pará, Amazônia Oriental.

No início da década seguinte José Batista ingressou no Seminário da Diocese de Conceição do Araguaia ficando até 1992, concluindo seus estudos de Filosofia e Teologia pelo Instituto de Pastoral Regional (IPAR).
Mesmo depois de ter deixado o seminário continuou militando na Igreja Católica e nos movimentos sociais. Foi Agente de Pastoral da Diocese de Conceição do Araguaia junto às Comunidades Eclesiais de Base, professor do Ensino Médio, em Xinguara e Coordenador do Movimento da Vida e Contra a Violência de Xinguara onde contribui decisivamente na luta de várias comunidades de posseiros da Diocese de Conceição do Araguaia, sobretudo dos municípios de Rio Maria e de Xinguara.

José Batista é advogado, membro da Comissão Pastoral da Terra de Marabá desde 1996. Graduou-se em Direito pela Universidade Federal do Pará. Desde então, vem atuando como advogado nas causas de camponeses da região. É membro da Coordenação Nacional da CPT, da Comissão de Direitos Humanos da OAB/PA e participa da Rede Nacional de Advogados Populares (RENAP).

No Sudeste do Pará, advoga a causa de trabalhadores(as) ligados ao movimento sindical, MST e MAB. Acompanha mais de 50 processos, quase todos contra interesses de grandes fazendeiros e empresas da região como a Companhia Vale do Rio Doce. É assistente de acusação no processo que apura o assassinato da missionária Dorothy Stang.

Recentemente foi condenado a dois anos e cinco meses de prisão sem direito à pena alternativa. O processo se refere à ocupação da Superintendência do Incra em Marabá, em 1999, por mais de 10 mil trabalhadores rurais de acampamentos e assentamentos da Fetagri e do MST, dos quais era assessor nas negociações.

Luiza Augusta Garlippe
Luiza Augusta Garlippe nasceu em Araraquara, no interior paulista, em 1941, filha de Armando Garlippe e Durvalina Santomo Garlippe. Mudou-se para a cidade de São Paulo, onde fez o curso de Enfermagem na Universidade de São Paulo (USP), formando-se em 1964. Em seguida, passou a trabalhar no Hospital das Clínicas, chegando a Enfermeira-Chefe do Departamento de Doenças Tropicais, assunto em que se especializou, fazendo inclusive algumas viagens pelo país como ao Amapá e Acre.

Participava da Associação dos Funcionários do Hospital das Clínicas, era militante do Partido Comunista do Brasil (PC do B) e teve destacada atuação na luta contra o regime militar. No início dos anos de 1970, foi destacada pelo partido para atuar no Araguaia, indo viver na região do Rio Gameleira, onde desenvolveu intenso trabalho de saúde, destacando-se como parteira. Era conhecida na área como Tuca e assumiu a coordenação do setor de saúde da guerrilha após a morte do médico João Carlos Haas. Integrava o Destacamento B e era a companheira de Pedro Alexandrino, também desaparecido desde 1974.

Foi vista viva pela última vez por seus companheiros no dia 25 de dezembro de 1973, em um acampamento próximo à Serra das Andorinhas, antes de intenso tiroteio do exército contra os guerrilheiros. O Relatório do Ministério do Exército diz que é “considerada desaparecida desde maio de 1974” e, o do Ministério da Marinha, que teria sido “morta em junho do mesmo ano”.

Segundo relato de Hugo Studart: “Foi presa em julho de 1974, em companhia da guerrilheira Dinalva de Oliveira Teixeira, a Dina e as duas foram executadas no mesmo dia, próximo de Xambioá”.

Márcia de Oliveira Jacintho
No dia 21 de novembro de 2002, Márcia de Oliveira Jacintho falou pela última vez com seu filho, Hanry Silva Gomes de Siqueira, 16 anos, quando se preparava para sair de casa para levar a neta ao médico. Não o reencontrou mais tarde quando voltou para sua residência, no Morro do Gambá, Lins de Vasconcelos, zona norte do Rio de Janeiro. Somente ao acordar no dia seguinte, e descobrir que o filho não dormira em casa, pressentiu a tragédia que modificou para sempre sua vida.

A luta de Márcia de Oliveira Jacintho começou quando a Polícia Militar do Rio de Janeiro registrou na 25ª Delegacia de Polícia a morte de seu filho, como “auto de resistência”. No dia em que seu filho não voltou para casa e apareceu morto com um tiro no peito, Márcia ficou completamente abalada, e o luto se transformou em luta.

Durante seis anos, Márcia Jacintho investigou a morte do filho. Colheu depoimentos, localizou testemunhas e conseguiu realizar perícia no local do crime. A perícia indicou que Hanry foi morto com um tiro no peito em trajetória descendente. O laudo contrariava o relato dos PMs sobre troca de tiros com traficantes. Ao final da investigação, Márcia já havia se formado no ensino médio e cursado o primeiro período de Direito para conseguir argumentos afim de provar que o filho não morrera em troca de tiros com a polícia e sim assassinado.

Após uma verdadeira batalha, Márcia Jacintho, dilacerada pela dor e indignada com a injustiça, conseguiu marcar duas importantes vitórias contra a violência policial nas favelas e bairros populares da cidade do Rio de Janeiro: provou que o filho não tinha envolvimento com o tráfico de drogas e, quase seis anos após o crime, o policial Paulo Roberto Paschuini, que confessou ter sido o autor do disparo, foi condenado a nove anos de prisão. O outro réu, Marcos Alves da Silva, foi condenado a três anos de prisão.

Márcia Jacintho não parou por aí. Hoje em dia, luta para que outras mães não precisem passar pelo que ela passou. Milita na Rede de Comunidades e Movimentos Contra a Violência e costuma dizer que em nome da luta pela defesa da vida não vai se calar.

Sérgio Ricardo

Nasceu em Marília, São Paulo, em 1932, João Lutfi (Sérgio Ricardo), filho de Maria Mansur Lutfi e Abdalla Lutfi. Vindo da Síria, o casal se mudou para Marília em 1930. Em 1940, Sérgio ingressa no Conservatório de Música para estudar piano e teoria musical. Lá, extravasa seu temperamento inquieto e sua criatividade artística. Indo o ginásio, viaja para São Vicente, e começa a trabalhar na rádio Cultura São Vicente. Inicia como operador de som e locutor e passa para a discoteca – onde trava conhecimento com toda a música da época e amplia seu conhecimento da história da música. Do erudito ao popular, do nacional ao estrangeiro.

Na década de 1950, muda-se para o Rio de Janeiro e começa a trabalhar na noite. Sucedem-se rápidas e fecundas transformações, até o surgimento da Bossa Nova. Descobre Johnny Alf, Moacir Peixoto, João Donato, João Gilberto, Lúcio Alves, Tito Madi, Fats Elpídio, Esdras e outros com os quais aprende a música mais elaborada, pesquisando formas e o bom gosto vanguardista que cada qual expressa com seu instrumento, interpretação ou composição. Nos anos 60, sai o LP "A Bossa Romântica de Sérgio Ricardo", só com composições próprias: "O nosso olhar", "Ausência de Você", "Pernas", "Não gosto Mais de Mim", "Poema Azul", "Buquet de Izabel" e a de maior sucesso, "Zelão".

Seu primeiro filme, "Menino da Calça Branca", foi produzido em 35 mm. Roda o filme na favela Macedo Sobrinho. Sérgio é convidado pelo Itamaraty a representar o Brasil no festival de cinema de São Francisco na Califórnia. “Menino da Calça Branca” participa do festival de Karlovi-Vary (Tchecoslováquia). No Rio, ganha o Prêmio Governador do Estado. Em seu primeiro longa-metragem “Esse Mundo é Meu”, escreve, roteiriza, faz a trilha sonora e dirige, com a ajuda do Itamaraty.

Em 1963, ingressa no Centro Popular de Cultura – CPC da UNE, e se integra no movimento em universidades, favelas, portas de fábricas, usando a música como meio de conscientização. Faz a trilha sonora do filme de Glauber Rocha, "Deus e o Diabo na Terra do Sol", que lhe rende vários prêmios, enquanto Ruy Guerra acaba a montagem de “Esse Mundo é Meu”. Em 1967, Inscreve sua música “Beto Bom de Bola” no festival da TV Record. Chega à final, mas impedido de cantar pelas vaias, quebra seu violão e o atira na platéia; transforma-se em notícia no mundo inteiro.

Em 1968, decretado o AI-5, a ditadura enrijece cruelmente e institui a censura acabando com a liberdade de expressão, mas Sérgio Ricardo continua apresentando suas músicas de resistência: são dezenas de trilhas sonoras, 10 discos, além da produção cinematográfica e literária.

Em 2008, é agraciado com a Comenda da Ordem Cultural, pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos, em reconhecimento por sua trajetória e contribuição à cultura brasileira.

 Os cinco cubanos presos nos Estados Unidos:

Em 1998, o FBI prendeu cinco cubanos radicados em território norte-americano sob a acusação de espionagem. Durante 17 meses, sem que fossem levados a julgamento, foram mantidos em celas solitárias. Em 2001, o Tribunal de Miami condenou Gerardo Hernández a duas prisões perpétuas mais 15 anos; Antonio Guerrero à prisão perpétua mais 10 anos; Ramón Labañino à prisão perpétua mais 18 anos; Fernando González a 19 anos e René González a 15 anos. Desde então, seus advogados de defesa tentam um novo julgamento fora de Miami onde se encontra a máfia cubano-americana que influenciou nas decisões do júri e da juíza. Os cubanos tinham como missão descobrir planos de ataques contra Cuba, organizados em território estadunidense e com aval do governo, que ocorrem desde o Triunfo da Revolução Cubana, em 1959.

Gerardo Hernández
Nasceu em Havana, em 1965. Em 1989, graduou-se em Relações Internacionais, ano em que se somou às forças cubanas em Angola para lutar contra o regime racista da África do Sul. Participou em 54 missões de combate e foi condecorado com medalha de honra.

Antonio Guerrero
Nasceu em Miami, em 1958. Filho de pais cubanos que retornaram à Cuba no início da Revolução Cubana. É engenheiro de construção de aeroportos. Trabalhou na expansão do Aeroporto Internacional de Santiago de Cuba. É poeta e tem vários poemas compilados no livro “Desde Mi Altura”. Ramón Labañino nasceu em Havana, em 1963. Em 1986, graduou-se em Economia pela Universidade de Havana como o primeiro da classe. Na universidade também se destacou em atividades desportivas, tendo participado de todos os campeonatos caribenhos.

Fernando González
Nasceu em Havana, em 1963. Graduou-se em Relações Internacionais. Na universidade, destacou-se como liderança na Federação dos Estudantes Universitários (FEU). Participou da Brigada Internacionalista Cubana em Angola contra o regime sul-africano e foi condecorado com medalha por bravura.

René González
Nasceu em Chicago em 1956. Seus pais eram trabalhadores que emigraram para os Estados Unidos e retornaram à Cuba. Serviu em Angola onde foi condecorado por bravura. Estudou aviação e formou-se em piloto e instrutor de voo. Está escrevendo um livro sobre as violações de direitos que tem sofrido. 

Procuradores da República:

Eugênia Augusta Gonzaga Fávero
Eugênia Augusta Gonzaga Fávero é procuradora da República em São Paulo. Mestre em Direito Constitucional pela PUC/SP. Ingressou no Ministério Público Federal em 1997, através de concurso público. Sua principal área de atuação vem sendo a tutela coletiva de direitos fundamentais, com ênfase na promoção de direitos das pessoas com deficiência e nas questões relativas à violação de direitos humanos durante a ditadura militar.

Nos anos de 2003 e 2004 exerceu a função de procuradora regional dos direitos do cidadão, por designação do procurador-geral da República. Nessa época, assumiu no Ministério Público Federal a condução dos procedimentos relacionados à localização de restos mortais de desaparecidos políticos. Durante essa atuação, exercida sempre com a colaboração do procurador regional da República Marlon Alberto Weichert, as principais realizações foram:

  • identificação dos restos mortais dos militantes políticos Flávio de Carvalho Molina e Luiz José da Cunha, e do espanhol Miguel Sabat Nuet;
  • propositura de ações civis públicas em face de ex-comandantes do DOI-CODI/SP e dos envolvidos na tortura e morte de Manoel Fiel Filho;
  • envio de recomendações à Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos, da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República;
  • interposição de diversas representações solicitando abertura de ações penais contra suspeitos de envolvimento com a tortura, desaparecimento forçado e assassinato de opositores do regime militar.

Foi professora de Estágio de Prática Civil da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo, no período de 1994 a 2003, e Promotora de Justiça no Estado de São Paulo, no período de dezembro de 1996 a fevereiro de 1997, ambos os cargos assumidos mediante aprovação em concurso público.

Marlon Alberto Weichert
Marlon Alberto Weichert é procurador regional da República. Ingressou no Ministério Público Federal em 1995, como procurador da República em São Paulo. Sua principal área de atuação tem sido a tutela coletiva de direitos fundamentais, com ênfase na promoção do direito à saúde e nas questões relativas à violação de direitos humanos durante a ditadura militar.

De 1998 a 2000 exerceu a função de procurador regional dos direitos do cidadão, por designação do procurador-geral da República. Nessa época, deu início no Ministério Público Federal aos trabalhos relacionados à localização de restos mortais de desaparecidos políticos. Em 2003, foi promovido a procurador regional, para atuar perante o Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Por solicitação e designação da procuradora da República Dra. Eugênia Augusta Gonzaga Fávero permaneceu atuando em inquéritos civis relacionados à repressão à dissidência política durante a ditadura militar, em paralelo às suas funções perante o Tribunal.

Algumas atuações relacionadas à promoção da justiça transicional: co-autor da ação civil pública em face de ex-comandantes do DOI-CODI/SP; co-autor da ação civil pública em face dos envolvidos na tortura e morte de Manoel Fiel Filho; co-autor de diversas representações solicitando abertura de ações penais contra suspeitos de envolvimento com a tortura, desaparecimento forçado e assassinato de opositores do regime militar; autor do estudo sobre a caracterização dos crimes da repressão durante a ditadura militar como crimes contra a humanidade, imprescritíveis e não passíveis de anistia; instaurou Inquérito Civil sobre os trabalhos de identificação das ossadas do cemitério de Perus; instaurou Inquérito Civil sobre desaparecimentos forçados durante a Guerrilha do Araguaia. Neste trabalho foram identificadas e formalizadas pela primeira vez provas da repressão em grande escala no Araguaia, como a prisão e tortura de milhares de pessoas da população civil em bases do Exército. A instrução do procedimento revelou também que o Exército ainda exerce pressões sobre ex-colaboradores das Forças Armadas para impedir a apuração da verdade sobre o combate aos guerrilheiros do Araguaia.

Também são muitas suas atuações em outras áreas de promoção dos direitos humanos no Ministério Público Federal, como na área da saúde.

 
Homenagem especial:

Manoel Bezerra de Mattos Neto
Manoel Bezerra de Mattos Neto, quando foi assassinado em janeiro de 2009, aos 40 anos, era vice-presidente do PT e membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB em Pernambuco. Foi assessor do Deputado Federal Fernando Ferro (PT-PE) e vereador no município de Itambé. Sua história é marcada pela militância como defensor dos direitos humanos. Defendia trabalhadores rurais sem-terra e atingidos pelas violações de direitos humanos. Nos estados da Paraíba e Pernambuco, desde a década de 1990 denunciava de maneira corajosa e persistente a ação dos grupos de extermínio e suas redes na polícia, assim como o envolvimento de comerciantes e políticos locais.

No ano de 2000, Manoel Bezerra foi eleito o vereador mais votado de Itambé-PE e chegou a ser presidente da Câmara de Vereadores. Pautou seu mandato no combate à corrupção e na luta pela moralidade pública. Solicitou providências das autoridades para investigar e punir os muitos crimes de execuções sumárias praticados na região. Denunciou, na Tribuna Livre da Câmara e nos meios de comunicação, a atuação de “justiceiros” que se organizavam em grupos de extermínio na Paraíba e Pernambuco, sofrendo, por isto, diversos atentados e ameaças de morte. Elaborou um dossiê que documentava a ação de grupos de extermínio e a inação das polícias.

Em 2002, a Justiça Global e o então deputado estadual Luiz Albuquerque Couto solicitaram Medidas Cautelares à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) para proteger a vida do então vereador Manoel Mattos e outras pessoas que estavam fortemente ameaçadas por grupos de extermínio. A Comissão Interamericana autorizou a adoção de medidas cautelares solicitando que o Estado brasileiro concedesse proteção integral pela Polícia Federal e realizasse uma investigação para determinar os responsáveis pelas ameaças e atentados. O Brasil não cumpriu nenhuma destas recomendações.

Manoel Mattos, em 2005, ajudou a CPI da Câmara que investigou os grupos de extermínio no Nordeste. Desde então, passou a receber ameaças ainda mais graves e frequentes. Há cerca de dois anos Manoel Mattos estava sem proteção policial, embora ainda fosse constantemente ameaçado.

Em 24 de janeiro de 2009, quando Manoel Mattos estava com amigos na Praia Azul, município de Pitimbú (PB) foi assassinado por integrantes de grupo de extermínio. Ele deixou para seus três filhos, sua família e para todos nós um legado de luta e coragem em defesa da vida.