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Medalha Chico Mendes | homenageados 2007

Com a Medalha Chico Mendes de Resistência, o Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro – GTNM/RJ homenageia pessoas físicas ou jurídicas, nacionais ou internacionais, por suas lutas na defesa dos direitos à vida e à liberdade e por uma sociedade plural, fraterna e sem torturas, reafirmando sua dignidade e sua memória. Essa homenagem, prevista em seu estatuto desde a sua fundação, em 1985, vem sendo cumprida desde 1989, anualmente, no dia 1º de abril ou em data próxima.

Maria Dolores Perez – a Lola recebendo a Medalha Chico Mendes de Resistência em 2007

 

> Homenageados 2007

Nasceu em 1931, no Rio de Janeiro. De 1956 a 1971, foi diretor artístico do Teatro de Arena de São Paulo. Com o advento do terrorismo de Estado, Boal foi perseguido e obrigado a sair do país. Em 1971, já em Buenos Aires, foi diretor artístico do grupo El Machete; de 1976 a 1978, esteve com o grupo A Barraca de Lisboa e, de 1978 a 1986, com o Centre du Théâtre de l´Opprimé de Paris, França. Com a anistia volta ao Brasil e a partir de 1986, passa a dirigir o Centro do Teatro do Oprimido do Rio de Janeiro.

É autor de 17 livros, entre os quais: TEATRO DO OPRIMIDO, publicado em mais de 25 línguas.

Como professor, lecionou em várias Universidades internacionais.

Anualmente vem realizando Festivais com grupos que utilizam o seu Método, como por exemplo: o FESTEL do Rio de Janeiro e vários outros grupos em todo o Brasil.

Boal recebeu a mais alta condecoração da UNESCO, a Medalha Pablo Picasso, pela criação do Teatro do Oprimido, em 1994 e quatro títulos universitários Honoris Causa, além de outros títulos universitários. Do governo francês, recebeu o Oficier des Arts et des Lettres, em 1981. Também recebeu inúmeros outros prêmios no estrangeiro.

No Brasil recebeu os prêmios Padre Ventura, Sacy (duas vezes, de O Estado de São Paulo), Molière (duas vezes), Associação Paulista de Críticos Teatrais, CLIO da Academia de História de São Paulo; Baluarte do Samba, da Escola de Samba Acadêmicos da Barra da Tijuca,este último em 2003.

Sobre Augusto Boal e sua obra, já foram escritos vários livros.

Boal, amigo, parceiro e aliado do Grupo Tortura Nunca Mais/RJ: que conosco leva adiante, com suas palavras, suas ações e seu teatro, nossas experimentações, nossas dores, sofrimentos, alegrias, nossa história. Nossa história que é de todos, de todas as forças que nos atravessam e nos constituem; de todo esse coletivo de força.

Carmela Pezzuti, mulher extraordinária por ter nascido duas vezes: a primeira, foi em Araxá/MG, em 1926: a segunda, anos depois, em 1968, quando entrou na organização denominada COLINA (Comando de Libertação Nacional) que tentava derrubar o regime militar. A partir daí, a vida de Carmela não foi fácil. Entrava e saia das prisões onde era torturada, com muita violência, mas os torturadores não conseguiam ouvir de sua boca nenhuma denúncia que pudesse por em risco a vida de seus companheiros e de seus filhos.

Seus filhos, Ângelo e Murilo, eram os meninos com quem ela lutou toda a vida. Mas o que é interessante é que ela lutou para conseguir a libertação do seu país, com muita coragem e firmeza, sem nunca perder o gosto pela vida.

Em janeiro de 1969, foi presa pela primeira vez e levada para a Penitenciária de Mulheres em Belo Horizonte/MG, onde foi longamente interrogada e posta na “surda”. Foi solta e saiu em liberdade condicional. Entretanto, seus filhos que também estavam presos em BH foram transferidos para a Vila Militar no Rio de Janeiro/RJ, onde sofreram novos interrogatórios, torturas e, em seguida, foram transferidos para a Penitenciária de Presos Políticos em Juiz de Fora/MG.

A fim de continuar a luta Carmela se juntou ao grupo Var Palmares (Vanguarda Armada Revolucionária) no Rio de Janeiro e com o codinome “Lúcia” foi descoberta e presa em abril de 1970. No quartel de Polícia do Exército foi duramente torturada com choques elétricos e espancamentos.

No mesmo ano de 1970 foi seqüestrado o Embaixador Alemão e, em troca dele foram libertados, entre outros presos, Ângelo e Murilo. Em dezembro, em troca do Embaixador Suíço, também seqüestrado, Carmela saiu da prisão banida e exilada para o Chile sem nunca ter sido julgada e condenada.

No Chile Carmela fez todo tipo de trabalho, estudou até que chegou o Golpe de Estado em 11 de setembro de 1973, obrigando-a a se refugiar na Embaixada da Itália enquanto os filhos entravam na Embaixada do Panamá.

Foi assim que começou a vida de exilada de Carmela na Itália e dos seus filhos na França. Em Roma ganhava sua vida trabalhando como esteticista sem deixar de participar dos comitês políticos italianos e brasileiros. Ia muitas vezes a Paris para visitar os filhos e foi durante uma destas viagens que Ângelo morreu em um acidente de motocicleta enquanto voltava para casa após o trabalho. O choque e a dor foram terríveis. No dia do velório de Ângelo no Père Lachaise reuniram-se os exilados de toda a Europa para dar a última homenagem ao querido guerrilheiro.

Carmela voltou para Roma destruída moral e fisicamente, mas continuou a trabalhar levando à frente a luta para conseguir a Anistia para todos os perseguidos políticos brasileiros.

Em 1979 a Anistia foi decretada no Brasil e Carmela voltou ao seu país de origem deixando em Roma muitos amigos e admiradores que tinha conseguido envolver na luta para a libertação do seu País.

Em Belo Horizonte trabalhou como esteticista e como voluntária na Associação de Apoio a Creches Comunitárias – “Casa da Vovó”.

Seu filho Murilo foi para o Mato Grasso onde fundou a Associação de Apoio às Comunidades Carentes do Mato Grosso.

Atendendo ao chamado de seu filho Carmela foi se juntar a ele em 1984 para desenvolverem o trabalho com os camponeses, até que no ano 1990 ela assistiu a trágica morte do seu segundo filho.

Com 80 anos de idade e com a saúde abalada, Carmela continua sua vida em Belo Horizonte junto à sua família, seus amigos, suas lembranças e saudades.

Nasceu em 12 de julho de 1939, em Koblach, Áustria, sendo filho de Heinrich e Maria Krautler.

Cursou a Escola Primária em sua cidade natal e o ensino médio em Feldkirch, também na Áustria.

Aos 19 anos, ingressou no noviciado nos Missionários do Sangue de Cristo em Schellenberg, no Principado de Liechtenstein. Diplomou-se em Filosofia e Teologia pela Universidade Federal da Áustria. Com 26 anos ordenou-se sacerdote na Catedral de Salzburgo e partiu para o Brasil, estabelecendo-se em Altamira, no Pará.

Ali exerceu a função de professor de ensino Religioso, de Psicologia, de Filosofia da Educação e de Inglês no Instituto Maria de Mattias.

No ano de 1978, naturalizou-se brasileiro. Entre os anos de 1968 a 1980, foi o eclesiástico incumbido da administração dos bens da Prelazia do Xingu e também foi nomeado, em 1980, Bispo-Coadjutor da mesma Prelazia.

Entre os anos de 1983 a 1991, presidiu o Conselho Indigenista Missionário (CIMI). Foi nomeado, em 1992, Delegado da CNBB na IV Conferência Episcopal Latinoamericana em Santo Domingo. Em 1997, tornou-se Delegado da CNBB no Sínodo da América no Vaticano.

De 1995 a 2003, tornou-se membro da Comissão Episcopal da CNBB Nacional, sendo responsável pela Dimensão Missionária da Igreja Católica no Brasil e Presidente do Centro Cultural Missionário, em Brasília.

Novamente, em 2006, foi eleito presidente do Conselho Indigenista Missionário.

Dom Erwin tem sido, sem dúvida, um grande defensor dos povos oprimidos do sul do Pará. Por isso, vem sofrendo constantes ameaças por parte dos grilheiros e latifundiários da região. Tem combatido arduamente a prostituição infantil e, por tal motivo, continua recebendo ameaças de morte.

Dom Erwin Kräutler enfrentou os preconceitos e discriminações da oligarquia paraense e, mesmo assim, tem conseguido ser defensor intransigente da causa indígena.

Queremos fazer eco a este grito, de libertação dos oprimidos!

Nasceu em 28 de setembro de 1942, na cidade de João Pessoa, Paraíba. Por toda sua breve vida seria conhecido pelo apelido de Bebeto por seus familiares e amigos.

Foi o quarto filho dos oito de José Estácio Corrêa de Sá e Benevides, oficial do Exército e paraibano e de Jerusa Andrade de Sá e Benevides, professora, alagoana de nascimento e carioca por formação. Teria uma vida marcada por mudanças constantes. Estes deslocamentos pelo Brasil nos tornaram menos bairristas: nem paraibanos, nem cariocas, nem pernambucanos ou paraenses, mas apenas brasileiros. Nosso chão era o Brasil: sua gente, seus costumes, seus sabores, seus sons e suas cores eram a nossa pátria. Sua alegria a nossa alegria, sua tristeza a nossa tristeza. Esta brasilidade, junto com a formação cristã e solidária que nos foi dada por nossos pais, determinariam as escolhas de Bebeto.

Toda nossa vida foi determinada por mudanças em função da carreira militar de nosso pai até sua morte em acidente aéreo em 10 de Março de 1959, durante uma missão militar, perto de Belém do Pará. A Bebeto, aos dezesseis anos, coube a dura tarefa de acompanhar os restos mortais de nosso pai para ser enterrado no Rio, por ser o mais velho em casa e porque nossa mãe estava doente. Este fato mudou completamente Bebeto amadurecendo-o de repente. Até então era um garoto interessado apenas em jogar futebol e namorar.

O Bebeto tinha muita gana para viver e aproveitar bem a vida. Desde menino tinha horror a desigualdades e injustiças. Detestava sair muito arrumado por causa de seus amigos pobres. Também questionava ordens arbitrárias. Era um líder nato. Sabia articular times, ganhar simpatias, atrair amigos e namoradas. Tinha um jeito meio tímido que encantava as meninas. Não perdia tempo em discussões estéreis. Só debatia com quem estava interessado em convencer. Estas características seriam desenvolvidas progressivamente, quando passou à militância sindical e estudantil. Seu senso de humor e bom astral transformava situações de conflito e até impasse, minimizando a dramaticidade, e, muitas vezes, reestabelecendo o diálogo.

Sua trajetória política se inicia por volta de 1964/1965, simultaneamente na Faculdade de Economia da atual UFRJ e no Sindicato dos Bancários do Estado da Guanabara, pois era funcionário concursado do BEG (hoje BANERJ). Então militava no PCB, de onde saiu, após o Racha de 66, juntamente com Apolônio de Carvalho e seus filhos Raul e René (que eram seus colegas na Economia), Mário Alves e tantos outros para fundar o PCBR (Partido Comunista Brasileiro Revolucionário). Fazia parte do Comitê Central deste partido em 1972, quando ocorreu a sua morte em suposto acidente rodoviário, em 8 de março, na estrada para Caruaru - PE, ao lado da esposa Miriam Lopes Verbena.

Foram enterrados na noite do dia seguinte no Cemitério Municipal de Caruaru, na presença do marido da irmã de Miriam, que foi presa no outro dia quando recebia visitas de pêsames. Esta prisão foi noticiada como seqüestro em manchete do “Diário de Pernambuco”, e serviu para alertar à família de Bebeto sobre o que estava ocorrendo. Seu irmão foi a Pernambuco e recebeu de volta alguns pertences que comprovavam que ele fora enterrado em Caruaru, com o nome de José Carlos Rodrigues. A cunhada dele continuava presa e fora preso também Ezequias da Rocha, o amigo de Miriam, que emprestara o carro. Algumas semanas depois, o corpo de Ezequias foi encontrado atirado num poço, com sinais de tortura. Em seguida, mais de quarenta pessoas foram presas. Em junho de 1972, o Governo Médici comemorava o fim do PCBR no Nordeste.

Em janeiro de 1977, quando a família foi buscar os restos mortais de Bebeto e Miriam em Caruaru, estes tinham sumido devido a uma reforma que fora feita no cemitério e até mesmo o livro de registro dos sepultamentos feitos em 1972 desapareceu. Em 1991, nova tentativa frustrada, só em 1995 o livro de registro do cemitério de 1972 reapareceu. Os nomes estavam lá, mas os restos mortais nunca puderam ser recuperados. Por este motivo, a família recorreu à Comissão de Mortos e Desaparecidos em vã

Mais conhecida como LOLA, nasceu em Araraquara/SP, em 26 de outubro de 1923.

Formou-se em Biologia pela Universidade de São Paulo e, em 1949, fez Doutorado em Fisiologia Animal pela mesma universidade. Após publicação de diversos trabalhos nesta especialidade, durante o ano de 1956 e, como bolsista do Rockefeller Institut, fez curso de pós-doutorado na Harvard University, Cambridge, Masschussets nos Estados Unidos, fazendo também estágio nos três primeiros meses de 1957 no Laboratório de Biologia Marinha de Miami, Flórida.

Em 1976, em São Paulo, entrou em contato com o Comitê Brasileiro pela Anistia e tornou-se sua militante. Lola que não teve nenhum familiar preso ou desaparecido e não foi perseguida política, assim mesmo foi uma intransigente defensora dos direitos humanos, participando ativamente das atividades do CBA de São Paulo até se aposentar na USP, quando veio morar no Rio de Janeiro.

Aqui, continuou participando das atividades do CBA do Rio até o encerramento de seus trabalhos no início dos anos de 1980. Em abril de 1985, participou das primeiras reuniões do Grupo Tortura Nunca Mais/RJ, que aconteciam no Sindicato dos Jornalistas. Lolinha foi uma de suas fundadoras e, algum tempo depois, tornou-se Secretária da entidade. Durante mais de 20 anos foi responsável por toda a correspondência do Grupo, incluindo aí as denúncias de violações de direitos humanos que se fazia em nível nacional e internacional, os conhecidos “Alertas Urgentes”. Era também responsável por responder às inúmeras denúncias que se recebia de violações no Brasil e na América Latina.

Incansável permaneceu militando no Grupo Tortura Nunca Mais/RJ até a idade de 80 anos, quando por questões de saúde foi se afastando.

Para você, querida Lola, o nosso muito obrigado. Não só por sua militância e solidariedade, mas também por sua presença sorridente, tranqüila e sempre companheira.

Lucia Marina dos Santos é filha de pequenos agricultores que perderam a terra na década de 1980. Seus pais, como a maioria dos sem-terra do sul do Brasil, tiveram de entregar a propriedade a um banco para saldar dívidas. Os pequenos proprietários pegavam empréstimos para desenvolver a plantação e, em caso de problemas climáticos, a única opção era entregar a terra para o banco, pois nesse país os pequenos agricultores nunca tiveram seguro agrícola - diferentemente dos grandes proprietários de terras.

Depois disso, ela e sua família foram para a cidade, continuaram trabalhando na agricultura, mas como bóias-frias e meeiros. Em 1989, decidiu ser freira, para poder trabalhar e estudar. Certo dia, ainda em 1989, aos quinze anos, foi com um padre a um acampamento. Quando viu a forma de organização das famílias no local, os laços de solidariedade ao qual se prendiam para garantirem sua sobrevivência, a forma da juventude trabalhar, se organizar e estudar, não teve dúvidas: disse adeus ao padre e ficou no MST.

Permaneceu no acampamento. E como toda a juventude daquele local, seguiu trabalhando no campo com esperança de conquistar sua própria terra, concluiu o primeiro grau na escola do próprio acampamento, que foi construída pelos trabalhadores com a madeira da sede da fazenda - que servia para guardar armamentos. Depois, fez seu segundo grau na primeira turma da Escola Josué de Castro, onde o MST tem seu Instituto Técnico de Capacitação e Pesquisa da Reforma Agrária, em Veranópolis RS. Hoje, funciona lá uma agroindústria de produção de doces e geléias para exportação.

Em 1996, Marina foi transferida pela direção nacional do MST para o Estado do Rio de Janeiro para contribuir na organização e consolidação do Movimento, vivendo então em Campos dos Goytacazes e posteriormente na cidade do Rio, enfrentando todos os males do latifúndio canavieiro, explorador e escravizador, onde permaneceu até início de 2006. Lá, ajudou nas ocupações de terras, na conquista dos assentamentos e na organização dos trabalhadores rurais sem-terra do Estado (em especial dos ex-cortadores de cana e excluídos do município de Campos), além da construção da unidade da classe trabalhadora, para que pudessem estar juntos trabalhadores do campo e da cidade.

Ao falar sobre si, destaca: “Eu não meço esforços na luta veemente contra o modelo econômico, contra as grandes empresas e transnacionais que estão concentrando nossas terras, destruindo o meio ambiente e a biodiversidade de nosso país”.

Atualmente, Marina é integrante da Direção Nacional do MST e responsável pelas articulações políticas do escritório nacional de Brasília.

Miguel Baldez nasceu em 1930, no Rio de Janeiro.

Aos oito anos de idade, já ouvia e se interessava pelas conversas do pai com um amigo que lutava para libertar a mãe que fora perseguida e presa pelo regime nazista, na Alemanha. Hoje, ao lembrar daquela época, Baldez costuma dizer que “o bicho-papão da sua infância foi o fascismo”.

Já na juventude, o inconformismo diante da realidade social lhe valeu a seguinte observação do pai: “você é comunista, mas não percebeu ainda”. Como lembra o próprio Baldez, a frase era dita num tom mais de constatação do que de censura.

Foi a partir da renúncia de Jânio Quadros, em 1961, e do movimento de resistência popular que se seguiu para garantir a posse de João Goulart, que Miguel Baldez deu sentido político à sua rebeldia. Identificou-se, especialmente, com o movimento sindical vinculado ao CGT – Comando Geral dos Trabalhadores.

Com vários companheiros, Baldez formou um coletivo de reflexão e de resistência à ditadura militar que perdurou até os anos 70.

No transcurso desta década e no início dos anos 80, envolveu-se com a luta sindical dos professores, dedicando-se à construção de um Sindicato combativo.

A partir de 1982, dedicou-se à organização do Núcleo de Regularização de Loteamentos Clandestinos e Irregulares da Procuradoria Geral do Estado, uma demanda das comunidades excluídas da cidade do Rio de Janeiro. Ao ser criada, a Procuradoria do Município assume essa tarefa e o Estado cria um outro Núcleo – o Núcleo de Terras – que passa a atuar em ocupações que se transformam em assentamentos rurais, em Nova Iguaçu, Paracambi, Piraí e em outros municípios do estado. Desde então, passou a assessorar os movimentos de luta pela terra, tanto urbanos como rurais, como a Articulação Nacional do Solo Urbano (que atuou intensamente na luta pela Reforma Urbana e na Constituinte de 1988) e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), quando este se organiza no Rio de Janeiro.

Nesta mesma época, também participou da criação do Fórum de Luta Pela Vida e Contra a Violência, com representação de entidades e militantes do Rio de Janeiro, Volta Redonda, Nova Iguaçu, Duque de Caxias e cidades serranas. O Fórum desenvolveu um extenso trabalho contra a violência institucional no campo e na cidade. O Fórum foi também a semente do pioneiro Curso de Direito Social do Programa de Cidadania e Direitos Humanos da UERJ, criado em 1991, um projeto que teve Miguel Baldez como um de seus formuladores.

Recebeu a Medalha Pedro Ernesto da Câmara Municipal do Rio de Janeiro, em 2002, por iniciativa do vereador Eliomar Coelho, do PT, e a Medalha Tiradentes, concedida pela Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro. Esta última homenagem foi proposta pelo MST e apresentada pelo deputado estadual Alessandro Molon, do PT, em 2005

Hoje, Baldez participa ativamente da criação do Conselho Popular do Município do Rio de Janeiro –– que escolhe seus membros em eleições diretas, através de assembléias populares realizadas nas comunidades. O Conselho é uma iniciativa de movimentos sociais e entidades, entre os quais a Pastoral de Favelas, a Federação das Associações de Favelas do Rio de Janeiro (Faferj) e o Núcleo de Apoio Jurídico Popular da Faculdade de Direito Cândido Mendes (NAJUP).

Nascido em Nova Iorque, Maranhão, Raimundo Alves de Sousa, o Raimundão, completaria 81 anos no último 16 de maio. Do nome de sua cidade natal, herdou o pensamento cosmopolita. "Internacionalista", corrige o maranhense.

Raimundo esteve internado no ambulatório do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Passou por mais uma cirurgia na coluna. "Muita porrada, o pau-de-arara na prisão", explicava à época.

O octagenário foi parar lá por suas idéias. Ele é comunista. De carteirinha. Fez de tudo na imprensa do Partido Comunista Brasileiro, e continua como o timoneiro desta. Começou a trabalhar como gráfico, "linotipista", e o sorriso aberto ao falar isto demonstra certo orgulho. "Você sabia que os gráficos foram os primeiros a organizar um sindicato no Brasil? Sabe por que? Eles sabiam ler".

Pela sua máquina, uma Frankhental alemã, que funcionava de forma improvisada com um motor Ford Buick de oito cilindros em linha, "pesava umas 70 toneladas", passaram os olhares de Pedro Mota Lima, Aydano do Couto Ferrz, Samuel Wainer, Moacyr Werneck de Castro, Raul Azedo Neto e Álvaro Moreira, entre outros.

Todos para conferir o trabalho de Raimundo, e - de certa forma – o deles também. "Aprendi muito com essa gente", diz Raimundão. Suas companhias não param por aí. De suas mãos muitos jornais foram entregues a Mario Lago, Nora Nei, Portinari e Jorge Amado. "Organizava esse pessoal para as brigadas, para distribuir a Tribuna Popular. Deixar na mão de intelectual não ia sair nada..."

Na época, afirmava Raimundo, o PCB estava recém legalizado, em campanha pela Constituinte. Elegeu 14 deputados federais, e a recém lançada Tribuna tirava 90 mil exemplares por dia. "Aos domingos, chegava a 150 mil". O gráfico coça a cabeça e ressalta: "põe aí que na época a população carioca era duns 2 milhões, o jornal era lido por mais de 10% da população!"

A preocupação com os números se justifica. A todo momento, o linotipista quer exaltar a história da imprensa comunista. A queda do império vermelho tem sua importância reduzida, "caiu o muro, não o marxismo", enquanto outras ditaduras do proletariado são exaltadas, "Cuba tá aí".

Esteve em Cuba e na ex-União Soviética. Sua filha mais velha formou-se em Belas Artes na União Soviética. Já a cria mais nova da prole de cinco herdeiros, Mayra Terçarioli, foi feita em São Paulo, onde Raimundo cultivou amizades durante o período de exceção.

Aliás, é preciso dizer: este homem adora um rabo de saia! E os 81 anos? "Fui criado com leite de cabra, carne de paca, de tatu!" Então tá...

Mas o sorriso maroto, de quem se sabe juvenil, se desfaz. Em 13 de abril de 2005 faleceu sua última companheira, Maria Luiza de Rezende Mathias. Era 34 anos mais nova que ele.

"Em 1975, ela rodava a Voz Operária (jornal do PCB na época) na Gonzaga Bastos, ali na Tijuca, há três quadras do DOI-Codi da Barão de Mesquita". Ainda não se conheciam. Ele estava preso. Os jornais do partido, como a Tribuna e a Voz, mudavam de nome junto com as mudanças políticas da organização. Sobre as publicações, digamos, permanentes, Raimundo lembrva daquelas veiculadas por categorias, como Orla Marítima, O Ferroviário, O Rolo, O Vidreiro, O Securitário, Movimento Feminino e Movimento da UJC (União da Juventude Comunista).

"Também tínhamos clientes particulares, como a Gazeta do Brasil e a Luta Democrática". É, Tenório Cavalcanti já foi cliente de gráfica comunista. "Aliás - afirma -, uma vez eu e o Marighela compramos uma rotativa do jornal O Dia, negociamos um preço e o Chagas Freitas querendo aumentar. Quando fechamos a compra, ele fez questão de dizer que tinha dado uma contribuição para o PCB".

Naqueles idos dos anos 1950, para trabalhar no linotipo Intertype C4, Raimundo contratou Helio Quintanilha, até aquele momento paginador do Ultima Hora. "Era o jornal mais bonito do Rio, foi uma boa contratação".

É, ele se orgulhava de sua história na imprensa. Na imprensa comunista.

A Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência surgiu no ano de 2004 como fruto da luta mais organizada das comunidades e dos movimentos sociais contra a violência de Estado, a arbitrariedade policial e a impunidade.

Inspirada em mobilizações como as das comunidades do Borel, Acari, Caju e Manguinhos, bem como na resistência incansável de mães e outros familiares atingidos pela violência policial, a Rede (na época denominada Movimento Posso me Identificar) organizou em 16/04/2004 uma manifestação, ao completar-se um ano da chacina que tirou a vida de quatro jovens no Borel em 2003. Na ocasião, apresentou uma série de propostas e reivindicações ao poder público, que acabaram sendo respaldadas pelas Conferências Estadual e Nacional de Direitos Humanos, realizadas naquele ano. Entretanto, até o momento essas propostas não passaram de formalidade, porque as práticas e métodos da polícia face às comunidades e populações pobres em nada mudaram. Os policiais envolvidos em matanças e grupos de extermínio continuam sentindo-se muito seguros e certos da impunidade, como prova a chacina da Baixada de 31/03/2005, que tirou a vida de pelo menos 29 pessoas numa só noite.

A Rede também esteve presente com várias oficinas no Fórum Social Mundial em Porto Alegre, em janeiro de 2005, quando foi lançado o documentário "Entre Muros e Favelas" e apresentadas diversas denúncias sobre a violência policial, assim como propostas a setores da sociedade, no sentido da constituição de redes de apoio a comunidades atingidas pela violência estatal.

No mesmo ano de 2005, realizou manifestação em abril, em conjunto com o MST, lembrando os massacres cometidos pelas forças de repressão na cidade e no campo.

Desde 2006, junto com diversas outras organizações e movimentos sociais, vem desenvolvendo a campanha contra o blindado Caveirão e outros instrumentos similares, símbolos de uma política de segurança baseada no confronto, na resposta puramente militar ao problema da criminalidade e no desprezo aos direitos humanos das comunidades pobres e marginalizadas.

Ao longo desses anos de atividades, busca construir uma Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência como um movimento social independente do Estado, de empresas, de partidos políticos e de igrejas, que possa reunir moradores de favelas e comunidades pobres em geral, sobreviventes e familiares de atingidos pela violência policial ou militar e militantes populares e de direitos humanos. A Rede se constrói pela soma, com preservação da autonomia, de grupos de comunidades, movimentos sociais e indivíduos, que lutam contra a violência do Estado e as violações de direitos humanos praticadas por agentes estatais nas comunidades pobres.

Seus objetivos são:

1) Estimular e promover movimentos permanentes nas comunidades, de prevenção e denúncia da violência estatal, propiciando seu relacionamento e apoio mútuo;

2) Reduzir o número e a freqüência, até a total eliminação, dos casos de mortes e violações de direitos devidos à atividade policial/militar;

3) Exigir do Estado reparação às vítimas e sobreviventes de abusos e violações cometidos por agentes do Estado;

4) Construir na sociedade uma rede de apoio jurídico às comunidades contra a violência policial/militar;

5) Construir na sociedade uma rede de apoio médico, psicológico e social aos atingidos e sobreviventes da violência estatal;

6) Construir na sociedade uma rede de denúncias, em nível nacional e internacional, de casos de violência e violações de direitos pelo Estado nas comunidades;

7) Junto com outros setores da sociedade, lutar contra as causas econômicas, sociais, históricas e culturais da violência contra as comunidades, da criminalização e preconceitos contra os pobres e da desigualdade social.

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